uma história do ser humano brasileiro latinoamericano
século meio 20 meio 21
nascido meio que junto com a internet
tecnologia de ponta de faca
de cano de arma apontado pra cara
sujeito meio branco meio pardo meio preto meio índio meio claro meio escuro meio caminho andado até aqui.
disfarço, busco o que sou eu, leio uns negócio, me sinto perdido, encontrado,
quero alento, vento na cara, árvore pra escalar, ver sorriso na cara de quem eu amo.
cansaço.
neguei a norma gramatical, pau no cu de portugal, europa, metrópole, colonização de bosta, eu falo brasileiro, deixa a gente em paz, agro do caralho, cansei de ver essa merda dá errado, e mal comecei a viver, ainda que já tenha vivido um tanto depois de tanto morrer.
boca suja das mentiras que eu precisei engolir
parte de mim veio de lá, outra parte veio de cá. num sou nem isso nem aquilo, sou apenas o ENTRE-LUGAR.
alimento minha alma do que eu quiser, ainda que esse querer seja confuso,
antropofágico
produto de propaganda. quero o que me fizeram querer? ou o quê?
pra saber, sei lá. segue lendo, ouvindo, sentindo, observando, ajudando, se questionando,
e o que sobra de tempo pra existir? resistir? não sumir?
se manter em movimento,
ainda que por vezes ele seja só interno
fermentando os próximos capítulos da minha própria novela no canto do meu quarto
sinto uma profunda descrença, paradoxalmente permeada de uma fé absurda: no outro, em mim, nos meus guias, na proteção que vem do lado de lá e do lado de cá.
é muito fácil desesperar.
se manter são, parça, é parte do processo de resistir e reconquistar.
mas é confuso. nesse mundo cada vez mais obtuso. todo mundo nas suas tela, inclusive eu, e não me leve a mal, sou só um outro mano tentando ver qual é, tentando melhorar ao mesmo tempo que tô buscando me aceitar.
é tenso viver e ao mesmo tempo sonhar, se perguntar: esse sonho é meu? ou é só o que é conveniente pra essa lógica de capital de bosta.
sem rima
veia aberta, escancarada, sangue jorrando, mas coração ainda pulsando
CANSAÇO
que saudade do CANGAÇO que eu nunca vivi.
antes era só pegar as arma, como sabia Maria Bonita e Lampião, e explodir a cabeça de quem te impedia de sorrir.
agora essa porra tá tudo blindada.
vai lá, assalta o banco, leva os malote,
dinheiro é só desculpa pra parecer que alguma coisa tem valor.
hoje em dia, tudo se transformou em número na tela de um computador,
quem manda mesmo não se mostra
guilhotina agora é aposta
tem um alvo o tempo todo nas tuas costa
e uma tela o tempo todo na tua cara
o grande irmão agora é uma rede fragmentada
derruba um cai outro no mesmo lugar
descentralizou, espalhou, sistema financeiro que gerou
uma sociedade blindada contra revolução,
tiraram tudo do teu alcance
nada mais cabe na tua mão
além da tela da tua insatisfação
sociedade do cansaço, sem tempo nem espaço
correria insana rumo à própria morte em busca de alguma sorte
derrotista? derrotados.
ao menos nos moldes passados.
é preciso ideia nova
desglobaliza, localiza, olha pro teu lado,
contamina quem puder
lembra dos ensinamento, mas lembra também do movimento
tudo mudou e é tudo a mesma coisa ao mesmo tempo
batalha de classe insana, modernizada, informatizada,
trabalhada na arte de moer o espírito de cada irmão
até que ninguém mais queira sair do chão.
fica em pé, porra. tamo aqui pra lutar, sangrar,
se cuidar pra tá inteiro na hora que precisar.
precisão. paciência.
agora é só questão de tempo até tudo ruir de novo,
quanto tempo até a próxima crise? o que vai sobrar pra nois ter que pagar?
não me leve a mal
num tenho resposta
mas tenho uma metralhadora de ideia que fermenta e me atormenta
em cada noite de sono, em cada despertar nesse mundo de entranha exposta
memória pra conservar esse espírito, essa mente e esse corpo que por aqui passa
sigo fazendo meus corre, indo atrás, buscando aquilo que satisfaz
e isso tem a ver com saber que os irmão tão em paz.
perspicaz é o modo como tudo se transformou numa roda que esmaga a tua carne, tua vontade, teu espírito, tu.
tu
existe.
apesar de banco, sistema financeiro, globalização, dívida externa, colonização eterna.
num tô falando de mim
mas meio que tô falando sim
a identidade do entre-lugar
pertencer ao despertencimento
nascido em colônia
sugada por metrópole
em tempos tardios de envelhecimento do capital
de crise profunda sem entender é quasa nada, pai,
mas cheio de sangue no olho.
não se identifica nem com aqui nem com lá
nem com lugar nenhum
ao mesmo tempo que se identifica com tudo
pertence a esse todo estranho, intrínseco, cheio de entranha, sangue que flui, cabeça que desanda nos pensamento
cidade entulhada de gente mal encarada
confusa e desesperada
concreto morto, cidade imunda
capital lucrando com seu medo, cada loco cada vez mais vivendo por si, enchendo o nariz de pó, as veia de agulha, tudo pra não passar a corda no pescoço, não colocar o cano na têmpora, se manter aqui, já que nascemos nesse lugar
e quem sou eu pra culpar?
ainda assim
em meio à falta de rumo do sujeito humano
habita o sol, tem ar ainda entrando nos teus pulmão. tem vida ainda saindo pelas tuas mão.
meio singular, meio plural
por baixo de tudo que te fizeram acreditar
tem um ser humano inteiro, cheio de vontade de se expressar.
e isso num vai ser comprado,
num vai ser vendido
vai ser é compartilhado
até geral entender
que ou todo mundo vive
ou vai todo mundo morrer asfixiado.